sábado, 22 de outubro de 2011

NÃO TENHO TEMPO – Parte – II

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O bem sucedido Advogado, mais uma vez chegara em casa tarde da noite devido os seus inúmeros compromissos. Há anos, por ser bastante conhecedor sobre os males causados pelas drogas e também de sua prevenção, e além disso, ser possuidor de uma excelente oratória, havia se transformado em um dos maiores entendidos sobre este mal do século, que a cada dia toma proporções assustadoras.

Tudo isso, somado as reuniões com clientes, visita a presos, audiências em diversos estados, o fez tornar-se um homem que contava os minutos dos dias e não mais as horas, pois para ele, o tempo valia ouro.

Esse seu trabalho lhe deu em troca muito status, mansão como lar, carros, uma gorda conta bancária, além de lhe garantir algumas viagens no exterior, onde aproveitava para estudar mais ainda.

Naquela noite, pela quinta vez consecutiva, o seu filho lhe esperava para conversar, pois estava se tornando cada vez mais raro o diálogo entre ambos.

- Pai... – Na sua voz havia um pouco de medo.

Ele estava no escuro, parecia que havia adormecido no sofá enquanto esperava.

O pai sequer lhe olhou nos olhos. Apenas o interrompeu:

-Agora não, filho. Tenho que me preparar para um julgamento amanhã bem cedo.
- Mas pai...
-Já falei...Não se preocupe, pedi a secretária para depositar a sua mesada e sobre o carro novo, quando eu voltar da Europa, a gente conversa sobre isso.
-Pai, não é sobre isso, eu só...
-Agora não. Não tenho tempo.
E sem falar mais nada ele subiu para o seu quarto, pois estava sozinho há muito tempo, logo agora quando mais precisava de seus pais e eles eram apenas passageiros apressados nessa viagem da vida.
Os dias se passaram e a cada nova intervenção do filho, se ouvia sempre a mesma explicação:
_ Hoje não tenho tempo, deixe para amanhã.
E nesta sua pressa nem percebia que o seu filho estava trocando o dia pela noite, como também caindo de rendimento no colégio.
Enquanto isso, na suas palestra sobre drogas, ele explicava para todos os presentes que o diálogo com os filhos era a melhor arma para combater esse mal, antes que entrasse no seu lar.
Sabia de cor e salteado todos os sintomas que denunciam o envolvimento de jovens com drogas, como também algumas fórmulas de como proceder diante da primeira oferta.
Porém, numa outra noite, ao chegar apressado em casa, nem sequer notou que o filho havia emagrecido rapidamente, e que seus olhos estavam sempre avermelhados e sua boca seca, além de mostrar dificuldade de raciocinar.
Alguns meses depois, quando participava de importante seminário sobre drogas, o celular tocou e, antes de desligá-lo, pois havia esquecido de fazê-lo antes, ainda olhou no visor e percebeu que era seu filho, aliás, essa era a terceira vez naquele dia.
Somente por volta das 23horas quando voltava para casa, foi que resolveu ouvir as mensagens que estavam no celular:
-Pai, sou eu. Sei que não tem tempo para mim, mas, por favor, me escute. Há meses que desejo falar com o senhor, pois preciso de um amigo. Chega de presentes caros, eu trocaria todos eles por sua presença agora. Estou pensando fazer algo que não deveria, mas não consigo vencer essa vontade louca, talvez se estivesse aqui do meu lado eu seria mais forte, pois há meses que quero sair disso e não consigo. Estou esperando a sua ligação. Tchau, pai.
Ele ficou curioso e rapidamente, aproveitando o semáforo no vermelho, leu a próxima mensagem.
-Pai, sou eu. Sei que não tem tempo para este seu filho, por isso quero que me escute como um cliente seu. Há cinco meses me envolvi com drogas e há dois que tento sair, mas não encontrei ninguém que me ajudasse e como você nunca tinha tempo pra mim, fiquei sozinho. Há pouco tentei falar com o senhor. Eu queria me desabafar e não vim mais aqui na bocada, mas não agüentei, então me dei mal, pois houve flagrante e estou aqui na delegacia. Por favor, venha como meu advogado, pois agora eu preciso do melhor deles, e somente assim irá ter tempo para mim. Não venha como pai, pois agora é tarde.
E quando chegou na porta da delegacia e viu uma ambulância parada. Algo dentro de si explodiu. Correu em direção à maca, onde estava um jovem deitado e, antes que perguntasse, alguém falou:
-Não é ninguém não, doutor, é apenas mais um que morreu de overdose.
-Ele é meu filho!
-Você é o pai deste garoto, doutor ?
-Não, nunca fui seu pai, pois achei que não tinha tempo para isso, pensei que tempo era dinheiro e só hoje percebo o tesouro que tenho que enterrar para sempre.
É nesta hora o celular tocou novamente.
Sem olhar quem era jogou-o longe chorando:
-Deixem-me em paz. Não ver que estou com meu filho.
E caiu sobre o corpo inerte do filho a chorar em silêncio, tentando ouvir, quem sabe pela última vez, chamá-lo de papai.
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Vaumirtes Freire – Sgt PM -autor do livro O Diário de Déborah

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